quinta-feira, 4 de outubro de 2007

bye bye Lisboa (VIOLANTE VERDE MIX)












1

Vazam-se por boqueirões, por becos,
No varonil carvão
Nos encastrados ecos,
No rebarbativo anão.
Nos vozeirões sêcos.



2

Desde manhã à noite, a raro lume
Se inquina o ciúme
E tanto então.
E os filhos que depois naufragam nas camas
De prostitutas taprobanas
Com arma e varão.



3

Lhana imperfeição?
Verdadeira a traição?
Salva a falsa Musa o livro
nado ou morto?
Singra soberba aonde miam as esganadas!
Saltam das vigas balburdiantes badaladas,
Vão-se os vãos e ficam-se as escadas.



4

Confunde-se literatura com maningantes hortos.
Irritam-me as artes quando dão p’rós tortos.
Tens sentimentos de escarmentada?
Ou ostentas ancas desprevenidas?




5

Enlevo-me a trotes?
Vozes onde atracam botes
Linguas onde se afinam motes.



6

Evoco o vácuo com um então tenaz:
Batem os carros nos outros atrás.
E que em terra convertida
Jazas & nasças. Ès la movida.
Fraqueja a mudança.
Humilha a presunção.
A canalhice cansa.
Baixa a tensão.
Tansa!
Atão?



7

Será rude o que se Cupida?
Pois Considera que a morte
Emerge como um lorde nas lojistas!
A razão, o freguês, tem-na a sempre à vez.


8

Vazam-se botes nas calçadas
Calçam-se botas nas touradas.



8

Gatas engatam.
E o peixe das badaladas
Esturge cá fora.
Fede a igreja em sardinhada.
Os manjericos namoram.
Bebem-se bicas amargadas.
Apagam-se ou oram as beatas.
Joga-se ao guelas e ao matas.


9

Considera o porte da morte,
E a tonta trágica da Marta.



10

Perdem-se em enfados os lojistas!
As oficinas desagravam as vistas.
Soam as brocas nos dentistas.
Um trôpego pedinte braceja,
Humilde, a presunção da morte.



11

Desde manhã a bordo! Vão. Felizes?:
Quem? Os funcionários de alheia empresa.
Bradam ao balcão sem rigor nem firmeza.
São tão outros, os petizes!


12

Ocorrem-me em revista, exposições,
favores de ofensas, lições de escrementado:
Silvano, venha cá limpar as botas,
Ou lambê-las, seu descarado!!!


13

Presumidamente entro em pânicos acres
Sem me desnudar no Meco
Nem me vestir nos Preciados.
Vai-se já para Hades usados!
Tou tão farto desse badameco!


14

E a melancolia amolece, que sinas!
Embrenho-me a mirar de tanto cismar,
por boqueirões, as velhas varinas
e o que resta ao fundo de um mar.



15

Vêm... Há! Vives? Em Queijas?
Pois sabes que louças e talheres
Flamejam, reluzem, mais as mulheres
cujos cabelos se douram pelas bandejas.


16

Enlevo-me (e edifico-me?) nas
Vozes amestradas dos edifícios.
Gosto de espreitar amíude as miúdas nas igrejas.
Quando é que me pagas umas cervejas?


17

Ou erro pelos cais quando sou capaz.
Nasce um tardar-me tanto, rapaz.
Que a causa dos males os menos
faz-nos, aos pequenos, mais amenos.



18

De um aturistado inglês me vem enfado,
a própria vida se refuga em desamores,
Bem sei estou, complicado.
Tirem-me daqui os tenores!


19

Absorta nos nervos a tal vizinha,
Se assentou junto à vida irrequietinha.
Considera os espanadores da morte,
Perca-se por sicrano a vox no trote.


20

O livro nada! Que cenas!
Singram serenas as tormentas
Nos bas-fonds das internetas
E nas ménages das Helenas.


21

Descalças vão às fontes?
Já não! Nem às verduras!
Nas descargas dos Mouros
Foi tudo má lição. Vidas duras!
Baixéis, heróis louros, gado...
O país é que anda a nado!
Singram soberbas naus na beleza.
Sai um bife a cavalo para a mesa.
Corta o cabelo um cabo estropiado.



22


Terá a cismar, por baixo, heróis:
tudo ressuscitado em duplicado,
tudo a ver muitos pelos dois.
Vê lá se dás conta do recado!



23

Luta Camões salvando-se num livro a nado!
Naufraga nas letras onde atracam botes.
Para um fado heroico é rebuscado.
Hoje as meninas já não têm dotes!


24

E os Paris, os Berlim, os Sampetersburgo?
Que aluguer careiro, ao fundo, num pardieiro!
Lês à luz esmiuçada dum tosco candeeiro?
Passa com estulta fúria um fútil fogareiro.



25

Flamejam os troncos varonis que recordam pilastras
e londrina e casta cicias cançonetas rascas.
Antes de te exibires olha para onde pastas!
As pitonisas cederam a fama a remexidas astras.



26

Luta Camões na natação livresca:
Salada de evocações que agrada a putanesca.
E evoco, por então, uma maja goyesca.
A morte areja algumas esquinas.
Hoje apetece-me ir à pesca!
Ou queres uma chásada com meninas?




27

Madrid: Camões no Corte Inglês,
Pessoa a ver-se a mais que a três.
Paula Rego monstrando-se em admirações,
Es tan guay ser português.



28

Mas se louvada, logo é lavada e levada?
Quem louva não gaba senão as perfeições humilíssimas.
Quem se lava é o rio do povo
No sal sem lágrimas do mar.



29

Se se abesorve no é pó, é já vidita?
E vai na vida, entre o pó e o dar o nó?
O que há é só ida
E o retorno é canção
Ou cortina corrida.
É bom fazer ó-ó
No colchão.



30

Vazam-se os arsenais no rigor
E no tinto rasca da morte?
Revesam-se os vesgos no horror
De passar o olho a um tio do norte.



31

Embrenho-me (vejam-se as notas)
Na tal soturnidade, men,
Nalguns motéis das motas
E naquela manca que lia
Calhamaços de filosofia
Género motorcycle zen.


31

Em terra prometida, prevertida, convertida
Que as sombras, o bulício,a tal soturnidade, a presunção,
a vária a firmeza, venham (coisa divertida)
ao que já se foi: a incerteza. Mundo cão!



32

Há afinal tal soturnidade
No peixe e nas badaladas
Que vivo escravo da esquivança
E cravo vivas à esquina que avança.


33

Tudo ressuscitado:
Luta Camões no estrado
E o que é que me dá vida?
A morte? O estado?
Reluz o visco nos rios,
Os hotéis da moda estão vazios.
A alma consente traições.
A falsidade emerge nas emoções.



34

Tardo-me tanto para causas.
Ataranto-me em serviços pouco sociais.
Travestis nas urgências dos hospitais
Dão aos enfermeiros algumas pausas.


35

Absorta no rigor orquídico
Despedes-te primeiro do Quico.
Depois beijas-me em repenico
E é só com ele que fico.


37

...muro verde aonde miam gatas...
Flutuam nas olheiras das obreiras
Uns bairros que já só são das latas:
Vai uns escalopes com champignons e natas?



38

Tua vida ferrenha
Fermenta em campanha
Camarada.



39

Paris, Berlim, Sampetersburgo, o mundo!
Cairo, Pequim, tudo é suburbano e fecundo.



40

Evoco, então, crónicas que não ouso:
sofística absorta num rigor viscoso.
E num cardume negro, hercúleos, galhofeiros:
heróis & tormentas saiem do galinheiro.


41

Saltitam como pássaros em gaiolas,
junto ao rio, alguns camones toscos.
Respeitosas senhoras pedem esmolas.
Mais além fabricam-se joões boscos.





42

Singram ao ombro papagaios, enfarruscados, secos.
Glórias antigas não consertam marrecos.
Embrenho-me. Caiem moedas para badaladas.
Saltam no Camões uns sandokans malaicos.
Os marinheiros afugentam as fadas.
Ai, os sons das guitarras são tão arcaicos!
Tias da lapa aquecem de novo as empadas.



43

Desde manhã que se vão. Felizes!
Já deram um estertor nos dentistas;
Um trôpego revisor arqueia-se
num intrépito temor. Vêem-se vistas.



44

Os filhos naufragamentam-se
e se atracam.
Saltam de voga em voga,
do body building p’ró yoga.



45

Considera que a morte tem beleza a mais,
E que é da laca e dos casacos de pêlos.
Curto a plebe a roçar nos arraiais
E os gatos-pingados que coleccionam selos.



46

Despertam-me as putas os botões
Num desejo abusado de sofrer.
No metropolitano vêm-me emoções:
Vem-me ao lado alguém lindo de morrer.




47

Considera os lojistas! As descargas de bananas!
Descem ninfas a calçada, até parecem manas.
Anafam-se algures os escuros candidatos.
Uma velha velhinha rega seus velhos cactos.


48

Desde o matinal tinido de louças e talheres
Até ao vesperal louvor dos guizados
Que tudo é faina e duros afazeres.
A noite quer-nos mais amados.



49

A nada te obriga teu fim: é confiança!
Rega candidamente teus malmequeres,
Relembra tua trança de criança!
Mas só te quero quando tu quizeres.


50

Ó confiança prevertida!
Ó desconfiança prevenida!
Ó moralidade estapafúrdia!
Ó balbúrdia na furdia!



51

Num trem de praça arengam em revistas,
Num trem de praça arengam as noviças:
a morte rigorosa
da moda.
A moda rigorosa
Da morte.


52

Mouros, baixéis, heróis, tormentas.
Olha as obreiras olheirentas!
E os maçaricos com uns portes tão altivos.
Num cardume ao lado tomam os homens motivos
de querubins do lar à noite p’rás reticentes ancas
(a bordo de nada as noites brancas).


53


E se esta morte
depois de naufragada ainda atraca botes?
E se esta tanga
Depois de desvendada arregaça a manga?



54


Evoco, então, a Misericórdia de roupão.
Topa-os todos, os «meus» que se vão. Felizes!
Chinocas, bléques, monhés, uma patroa e um cabrão.
Não sou o tal racista que tu dizes!


55

Assomam nas esquinas varinas assassinas.
Vêm a bordo das fragatas frenéticas e caninas
com firmeza, atracam os botes, as pepinas.



56

Considera morte,
Cardume da moda.
Considera o caos,
A arte, e o raio que a parte.


57

E evoco, então, por becos,
Uma nádega azul de rio
Um certo odor a bacio
Um vesgo verso do Cesário
Um verso vago do Cezarini,
Um Porto e um Dry Martini.
Tens cacau p’rós bonecos?



58

É a tal soturnidade da caridade.
A graça dá o nome à desgraça.
Flutuam nas varandas vis verdades.
E é fraca a mudança dos oportunistas.
Humilde a presunção das ideias mistas:
Nasceram, vai daí, todos os males
Que são pó, nada, facturas de dentistas.



59

Um trôpego chinfrim abraça o céu: parece baixo
do peixe e das badaladas,
Salta do que se me ajunta à vida?
Onde é que me encaixo?
És tão querida!
(coitadas!)


60

Não há soturnidade, nem a tal melancolia,
Seduz, viscosa. Uma cólica peregrina
Arrepende-me de ter comido pota.
Na colina um monge edita uma inútil escolia.
Outro barbeiro acabou de bater a bota.
Vemo-nos mais tarde, Marina Marina!


61

Num trem de cozinha
peixe podre gera a moda.
E esse cardume da moda
Agacha e encolhe a Graça.


62

Labaredas de louças, ó bem amada!
Frigideiras biblicas, cabeçalhos da Bola.
Um puto cheira mais cola.
Um cego mata à facada.

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

VIOLANTE MISTA





1

Vozes em terra convertidas.
Vozes em guerras resumidas.
Vozes que se vazam nas vidas.
Arrabalde de cousas divertidas.



2

Como não ma vêm dar à mão - a ficção:
sofística-se absorta num rigor estouvadamente tanto
troféus onde se aprazam os prantos
e se ejaculam argutos enganos.



3

Que a perfeição culpe a intrépita defensa
que se esculpe trepidando polposa
na erecção das ofensas:
gostosa.



4

Absorta no rigor adocicado da vida,
venha morte da morte pervertida
carapoa de corrida
capoa aperitiva.




5

Jaz nascer-me em burros prantos,
aborrece-me tardar-me em tantos.
Desaborrece-me o entender-te e aviar-te.
Borro-me de bodegados santos.




6

A causa de meu pranto é o rigor tanto deste enquanto.
A causa de meu gargalhar é o azul onde pastam as maselas das musas
Como ovelhas demasiado brancas
Em busca de hipotenusas.



7

O teu fim é tão preciso.
Não se suspende o riso.
Já tem vida velida,
mal lograda
No vão de escada
Que é da lida.



8

Enlevo-me nas cordeirices
e nas vozes de uma lhaneza inquinada.
Elevo-me
Na imprecisão soprada
Por um Orfeu fulminante
Neste instante fandangado.



9

Leu-nos curiosamente a norte
a dura chatice da morte.

Que logrado fim
Para um jasmim?



10

Enlevo-me nos danos do saber,
na sábia rudeza serrana,
não me arrependo de ser
menos ao menos bacano.



11


Vivo no ser tão descuidado
Cardume desirmanado
Acabado de trocado
Traste estado.



12

Pois sabes que onde me estou
da má vida vem fermento?
Doce obrigação, favorecente ofensa,
Faz olhinhos à’rependida
Pactua com o jumento.
És tão querida!



13

Lições de escarmentada ostentam acções secretas
Lenços de escancarada açucaram mais umas tretas.



14

Fraco o valor do que não é corpo.
Forte a valia do que lha topa.
Fraco piropo saí-lhe em arroto
Forte insulto fica na copa.



15

É doce a vida sem arrelia
que umidamente foi-se à via?
Aqui. No mim mi mago.
Não é, Iago?



16

E aprisionam-me multiplicidades douradas
e me obrigam a querer-te e dar-me:
ausente da alma estou, ó vida, cá despida:
dou-me em duplicação ferida
sem rimel nem massapão: ò prevertida!


17

E se esta morte desremunerada
não te enfraquece o valor,
acobarda porém as fortalezas
e o nada –
embriegada!



18

Sabes que a tua
ausência da alma
é esta minha tirana tão dura de roer,
este descaramento a emburrecer
esta paz feita alma.



19

Intrépito o temor,
dura a louvada dúvida
que leveda
lavadinha
no olvido.



20

Não te obrigues a querer vir
ao oráculo passear.
Não brigues a quereres vir-te
ao dráculo assear-te.



21

Jaz aqui a beleza mais louvada:
piedade! (puberdade?)



22

Delito é afiada firmeza,
fraco valor, cobardia.
Os túmulos são doutra tia
que não se suspendem
nas súmidades.
Santa Iria?



23

Primordial perguiça,
Faustoso leite materno
Um repenicado xissa.
Um seiozinho de alterno.



24

A presunção varia a firmeza.
A fermusura aprimora.
As primas arrimam na mesa
Os presuntos não namoram.



25

Perca-se nas prevenções a prevenida.
Apite-se o pitéu na Berlenga.
Madamas que desandam na vida
Lambem a lenga que lenga.




26

Aprende escarmentadas lições
Iça-se em sacudidos trambulhões
Hermetiza-se nos tacões
Faz-se à lota nos bulhões.




27

Ostentarás considerações
Nas cátedras dos calções.



28

Estou no que me dá vida?
Ou dou-me no que me estafa a vinda.



29

Considera que
jaz aqui a beleza mais rigorosa
E absorta
No seu horto
De maltês corto.


30


Terá o sentimento duplicado
Na capa velha do disco de fado.



31

Mas com enganos divertida
Vives do que ti não se defende na alma.
Aferrolhas-te à traição convertida.
Amoleces na verdade que salma.
Vives de escarafunchosa esquivança
Esperando carrinha de mudança.




32

Sou bastardo de avisos imerecidos
És bacoca de avóses meretrizes.



33

O riso é mui preciso
E o risoto pressuroso.



34

Vozes de uma dama que se enfada em fodas:
Traste o prazer, de um puro fado.
Vazas as camas se nã te dão nozes
Trazes a bilha como porco fardo.



35

Defeito a perfeição, ingratidão as lembranças.
Perfeito o deferimento, lentas merdanças.



36

Favores de ofensa não humilham presunções.
Presumíveis favas não dão milho a calções.



37

Não quero lhaneza devorante
Mas as ásperas e cumplices complexidades
E seus estretores colaborantes.
(doutas maldades?)



38

Delito a obrigação,
Perfeita a culpa.
Duvidosa a lhanesa.
Maçadores os louvores.





39

Terá a firmeza da mudança –
O fraco dossel que a mama amansa
O delirio de cordel
Que se indigita em pujança,
A indignidade de bordel
Que amanteiga a criança,
O duplicado papel
Que no arquivo em vão descansa.



40

Verdadeira a traição enruivece?
Falsa e amorosamente cesse?



41

Cicie o amor
E ceda ao cio
E ao súor:
Soror?



42

Não assentes túmulos
Junto às fronhas do teu peito.
Não engeites ofensas
Nem desenfronhes o leito.



43

Os verdadeiros corpos
Adoçam-se em mudos piropos.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

TÁBUAS (1992-5)


1

Havia nervuras, zonas atadas, nas quais alguém cozia retalhos. As pessoas iam para a cozinha, amavam tachos e panelas. Lembravam-se, ou alembravam-se, de antigas criadas desdentadas com a sua provincia secreta no ar concentrado com que manipulavam as batatas. Descascavam, cortavam, desossavam e trituravam. Tudo fumegava. Os cheiros entranhavam-se sob a forma de tripas. Aguardava-se a caça, o ladrar múltiplo dos cães entrando saciados e os homens vestidos com roupas de guerra sujando com pégadas lamacentas o chão acabadinho de encerar.

2


Havia outras pégadas lá fora, pegadas que tinham ficado sòzinhas a secar com a forma dos sapatos, a marcar os galhos partidos na floresta. Os bichinhos minusculos consideravam-nas umas excentricidades nos desnivelamentos das suas baixas paisagens.

3

Como ignorar a convicção de que um erro originara toda esta confusão? Um erro anterior a todos os erros. Um erro sem sequer ter um deus, maior ou menor, sobre o qual atirar as culpas e responsabilidades de as coisas virem mal formatadas ou amanhadas. Quando nascemos o erro estava por toda a parte. Alguns sábios procuravam formas de tirar partido (fama e fortuna) desse tentacular erro.

4

O híbrido era a lei, disfarçada de excepção. A teoria justificava o falhanço geral e o fatal esplendor. Mas quer o falhanço quer o esplendor eram deformações voluntárias de algo mais errático, que só tomava formas distintas para recusar um nome próprio sem destinos ou acasos.

5

As aranhas comiam queijo para se esquecerem de que eram eternamente aranhas. As aranhas tentavam representar o seu papel de aranhas. Porém enganavam-se constantemente.

6

O sol parecia um arado, abrindo gretas na lama que secava. Os seus raios cortavam: cortavam a terra como quem trinca fruta. Por sua vez os arados queriam ascender à condição de sóis. Mas teriam que se sujeitar a dificieis exames e a temíveis provações.

7

As pedras eram como esponjas, reclinadas para dentro na sua imobilidade ascética. Absorviam tudo o que podiam. Respiravam pouco porque as coisas paradas respiram pouco. Absorviam as sombras que passavam velozes, a luz que as inchava, e a atração de corpos muito distantes. As pedras aguardavam sossegadinhas o fim do mundo. Um fim frio, predominantemente rochoso.

8

Dentro da terra os textos tentavam trepar os fossos. Diz-se que há ouro e outros minérios radioactivos. Tudo está tapado e protegido. Nada é revelado. Na verdade os textos sufocam por ninguém querer escrevê-los. Quem quer abrir buracos?

9

Ela era a diva. Mantinha-nos calcinados num terror a que outros chamam sublime. Era terror por cima e por baixo, com os céus e a terra a tremer. Não havia dimensão que não fosse abalada. Nisso não residia nenhum mistério. Conheciamos a extensão do seu corpo porque, quando os pés pisavam a sua cauda, ela ofegava. Os pirilampos acompanhavam-na sempre como uma coroa.

10

À porta da casota destruída havia um osso abandonado de um cão abandonado. Esse osso era, evidentemente, um oráculo. Estava impregnado de letras que nem os cães, nem os homens, e muito menos os deuses, sabiam ler.

11

Com um novo e surpreendente crescimento do pescoço as girafas passaram a alimentar-se nocturnamente de queijo lunar e estrelas cadentes.

12

Os galhos de figueira eram extremamente moles e leves. Brancos por dentro. Levavam aos figos os segredos da terra: todas as intrigas que ignoramos, toda a conversa que os mortos falam entre si. A doçura dos figos mata devagar.

13

As crianças ficavam estendidas como lençois a secar ao sol porque o sol as embriagava. Quando se levantavam tinham por vezes o desejo legítimo de matar o sol.

14

O osso do cão era uma casa a fingir que não era casa. Por isso mesmo o interior do cão tinha-se tornado numa metrópole.

15

Um umbigo ligava-nos à ausência. A plenitude pré-natal vista daqui é sufocante. Esta separação que é o estarmos para aqui, de um lado para o outro, no dito cujo mundo, começa a parecer-nos algo afortunado. Há uma certa leveza, e, sobretudo, respirabilidade.

16

As tábuas dormiam num sono profundo. Rangiam como quem ressona.

17

Os anjos vinham atraídos pela magia. Sentavam-se em redor do caldeirão e ficavam a olhar e escutar. São belas as cozinheiras. E todas as cozinheiras, no fundo no fundo, são bruxas.

18

Os que entravam em possessão tinham um íman mesmo no meio do corpo onde as linhas se cruzam. Fechavam os olhos e eram atravessados por magnetismos. Ficavam insensíveis ao frio e ao calor. Tremiam, estrabuchavam, súavam. Assim, com os olhos a revirar! Não sei dizer se ficavam mais feios ou mais bonitos.

19

Os contactos com os demónios não eram contratos. Os possessos, na rudimentar jurisprudência demoníaca, também ficavam com o rabo de fora. E os possuintes sabiam que a coisa era temporária. Isto tem todo o ar de ser uma coisa a prestações.

20

A respiração soprava os pulmões. Quase os fazia rebentar. As pessoas começavam a compreender que eram sopradas e que podiam explodir a qualquer momento.
21

Tinha chegado a altura de moldar os céus. Partia-se muita pedra para forrar a muralha celeste. Foram centenas de anos com picaretas a triturar montanhas.

22

As cobras e os lagartos aproveitavam qualquer falha. Eram críticos excelentes. Ser crítico era tirar proveito de erros alheios. Mesmo que os erros não fossem erros mas apenas um modo mais pessoal de por as coisas certas nos sítios certos ou de sublinhar as coisas erradas como determinantemente/voluntáriamente erradas.

23

As alcachofras derretiam a sua geometria no vapor das caldeiras. O amolecimento do prestigio geométrico não augura nada de bom.


24

Os videntes preferiam atirar-se para os centros vulcânicos do que morrer nas soleiras das casas. Diga-se de passagem que os videntes não viam com olhos de vêr, mas com uma espécie de super-visão digna de herois da Marvel. As imagens que viam vinham em zapping. Não pode haver grande precisão quando se passa à descrição.

25

A comida fazia sofrer as tripas, desgastava-as. Mas não o suficente. Há algo de vivo e eriçado nelas. Resistiam. Chegavam mesmo a ficar mais fortes. Um dia ainda se tornariam protagonistas numa peça de Shakespeare.

26

E as vozes eram como lanças pelas quais estava rodeado. Um movimento em falso e morria pelo poder da boca.

27

A luz segurava a àgua, mantendo-a irrequieta. Quando a olhavamos feriamo-nos nos reflexos.

28

As cozinheiras engravidavam da comida. Davam ao mundo seres híbridos com cara de gente. As cozinheiras comiam esses seus filhos. Tinham mêdo que mais tarde eles as viessem a comer.

29

Os bébés quando nasciam eram postos em salmoura. As cobras circundavam-nos sem os tocarem. Alguém algum dia mataria involuntáriamente essas cobras.

30

No vaivem das criadas os elementos entravam em ebulição. Escutava-se as borbulhas a rebentar e os bicos dos pés a tentar ser silenciosos. Chutt… E cuidado com as correntes de ar… Tudo pode falhar por causa do bater de uma portada de janela!

31

Eles estavam à espera que os fuzilassem. Estavam contra a parede. A parede desmoronou-se. Seriam fuzilados no dia seguinte. Os mirones não ficaram nada satisfeitos.

32

As casas já nascem inclinadas. Um dia acabarão por caír para esse lado. Para compensar tal propensão as pessoas ocupam instintivamente o outro lado… em vão!

33

Aqueles eram mendigos clandestinos. Só pediam quando ninguém os podia escutar ou vêr.

34

Quando alguém queria suicidar-se pedia primeiro autorização. Depois exilavam-no para que pudesse morrer bem longe.

35

Os apocalipses tinham várias nascentes. Até há quem ache que tudo é nascente apocaliptica. Porém o fim, não o trágicamente pessoal, mas esse outro, generalíssimo e digno de talk-show, é para quando? Ainda não saímos dele, meu caro amigo!
36

O enorme ânus murmurava o nome de Deus. Depois usava uma escova de dentes porque se sentia conspurcado.

37

Lançavam os anzóis no poço e retiravam os marinheiros. Diz-se que as sereias os abandonavam aí. Alguém teria que sepultá-los.

38

Era a ultima vez que aquele espelho se movia. O mundo, a partir desse momento, é que iria entrar em movimento.

39

O sol, como todos sabem, também tem pulmões. Os pulmões por dentro são pintados de preto, por fora resplandecentes.

40

Se confeccionares um homúnculo não te esqueças que ele terá que nascer entre urina e fezes. Caso contrário…

41

O estilo tinha-o abusado. O que é dizer pouco. Todos os estilos nos abusam, de tal forma que a possibilidade, já magra, de termos uma personalidade, vai, queiram ou não queiram, defenitivamente por àgua abaixo.

42

Nesse teatro ofereciam máscaras aos espectadores. A peça consistia num enorme incêndio em que arderiam o teatro e os espectadores. Os actores ficavam a ver.

43

Polia o que tinha retido, o que ainda não conseguia expelir. Mas todos sabemos que não podia continuar a polir por muito mais tempo.

44

Afinal os oceanos continuam por baixo dos continentes que flutuam como corpos mortos. As tartarugas sabem o segredo e transmitem-no de geração em geração.

O SEU URSO TAMBÉM A AGARROU






Deêm-me a noite com o seu punhado de estrelas apunhaladas
E uma prima donna com plumas ausentes,
Dêem-me uma fêmea qualquer e uma obscura espingarda
E com ela assinarei os poetas dispersos nas tenebrosas letras
E as amantes que bocejam ao sol-por nos bairros de lata.

Dêem-me uma poesia ardente para que verdadeiramente arda,
Com suas musas obtusas, difusas, confusas:
Com elas regarei de palavras vagamente obscenas
As casas onde erram as osgas e as baratas.

Dêem-me o perfume com o qual é impossível viver
E o pescoço imaculado de uma avestruz
Retorcendo-se com uma caricatura de sexo sem capuz.

……………………………………………………….


1. Dispenso a glória trivial do teu corpo. Dispenso o gelo com pégadas de gato negro: o gato desapareceu no chocolate quente do mulato.

2. Detesta como se recusasses tudo desde a morte que não vêm. O adiamento escatológico torna inconsequente qualquer finalidade. Ansear é um adresso. Nada é nada que não tenha sido mas pode ser tudo o que ainda não chegou a ser.

3. A Lua torna-se prosaíca na nomenclatura anatómica. Desaparece no filão abstracto das veias como um cadáver redondo.

4. Entrou na minha ausência uma estupidez enorme. E a minha ausência é a presença musical dos outros, estonteante, repugnante como um lavagante.

5. Mesmo quando a paisagem se entranha nos dedos é aos dedos que sobra a paisagem. O resto da mão é membrana, íman impotente. Quer desentupir o lixo que abre as cavernas. Nas cavernas estão as patéticas alegorias e os labirintos vorazes.

6. A carne dos astros renasce no talho dos poetas. Renasce nas vinha de alhos da mulher a dias.

· poético é exaustivamente ridículo. O prosaico literalmente fascinante.

7. Coloca os dedos dos pés na minha raiva incolor. Aproxima-te com as plantas carnívoras que te tornam soberba. És como os exércitos que combatiam à beira do Nilo. Tens no teu séquito anões reluzentes. Anuncias a diáspora de todos os povos. Mostras os dentes como uma víbora faminta. És politica ainda que incorrectamente.

8. Só o cego contempla devidamente as alturas dos abismos. Os abismos não nos procuram. Cansam na sua abundância. Os cegos procuram as tragédias gregas e trincam romãs. Os cegos guardam o tempo num porta-moedas de senhoritas. Andam como se tivessem saltos altos.

9. Os tanques habitam poeticamente. O que não deixa de ser espantoso e ignóbil. Não podemos ignorar os tanques que acompanham as virgens nos seus cantos wagnerianos ou nas suas polifonias polinésias. A inocência exige estrondos e contribui para a glória sofisticada dos tiranos.

10. Alguns falam-nos de ciência como uma tarefa urgente, como se quizessem dar lustre às estrelas. Mas os cactos tornam indecifrável a sua precisão.

11. Não há acessibilidade sem prostituição poética. O poema degrada-se porque é a única forma de ascender. Nada menos poético ou autêntico que a pureza nas suas aparências mais ilustres e no seu prestigio secular.

12. Podes comparar a loucura a uma flor mas a loucura por multicolor que seja arrasa as flores. É necessária uma jardinagem excentrica que ame a erupção local de ervas daninhas.

13. Desembaraçamo-nos da violência das alquimias retóricas. Não necessitamos do exemplo amoroso dos transformadores da matéria. Estamos apenas na transformação cada vez menos exemplar.

14. E no entanto a ferocidade persiste nas madrugadas arrasadas. Ser estupido como uma cor. Ser banal como um ritmo que se multiplica na perseguição auricular. As presas são surpreendidas pela proximidade dos sons.

15. Ser, acima de tudo, abundante como uma vaca Suméria. Vacas que nascem como muralhas. O leite que delas jorra embriaga até os mortos.

16. Porque todo o amor é carnavalesco com as suas sedas espinhosas. E a arte, breve ou longa, explode no furor das serpentinas.

17. Falam-me do vinho, de drogas, de deuses: ainda é pouco. Estou desatento. Ainda não morro absolutamente nem quero morrer muito menos metafóricamente. A nossa morte anda em más companhias. Prefere sair pelas traseiras dos hoteis sem pagar as contas.

18. Pões uma àrvore de cócoras e achas admirável porque pensas que ela vai cagar pelos seus orifícios a merda que a tua amante te prometera. Alguns chamam-lhe a Terra Prometida mas não passa de um esterco gloriosamente primordial.

19. Desobedeces à tua desobediência. Lês que nada há para lêr nas entrelinhas. Forras a noite com um papel de parede piroso. Achas admiraveis os gatos vulgares das tuas vizinhas que gostam de assar sardinhas.

20. Tentas amansar a memória como se esta fosse uma pantera encardida. Chegas com os arquivos e as suas toneladas de documentos. São imensos e banais. São a tormernta que subjuga o delirio fraco dos poetas.

21. Renasce-se na desatenção. Porque não?

22. A violência não me parece graciosa. Alguns acham que sim. Não sei porque é que deveria estar de acordo!

23. As crianças ficam encurraladas em sonos dificeis. Os sonhos perseguem-nas como cobras alucinantes. Nem a luz as defende dessas sopas tenebrosamente misteriosas. Os sonhos são espectros pré-históricos que nos tentam arrastar para o principio do mundo, para estâncias incivilizadas, para o sabor a sangue de réptil. As crianças preferem o açucar que as desembaraça dos sonhos.

24. As amadas são como abutres que retiram as escadas que nos levam aos cumes da graça. As amadas tornam-se doces com a sua falta de mistério. Ninguém deseja morrer no seu vocabulário insultante. Mesmo quando rugem como leoas a quem mataram os filhos. Mesmo quando mentem como deusas sanguinárias.

25. Os animais à tua volta são baixos para fora.

26. Quem sabe muito sabe cada vez menos. O saber é a incerteza que surpreende no auge da sabedoria. Porém há os que julgam que a sabedoria chega aperelhada como carros-de-bois. Mas a sabedoria não chia.

27. Andas para trás e não há refrões de canções que te salvem. Continuas a sêr barroco mesmo quando és parco. Continuas a ser sublime mesmo com o teu focinho de porco. Gostas de uma harmonia feita de restos, de retalhos, de promessas quebradas, de honras destruídas, de espectativas desfeitas, de listagens inuteis. Gostas de concertar as dissonâncias. Queres sabores fortes. Não amas, nem de longe, a certeza asséptica das simplicidades.

28. A tua revolta não me traz felicidade. Rapaste os pêlos para deixares de estar nú. Puseste-te à vista para que ninguém te visse. E contúdo nunca foste exibicionista. Se fosses exibicionista serias humilde como a erva.

29. Os segredos já vêm espancados. Afogas-te nos contornos das sombras. Arrancaste o nome às amadas com torturas ignóbeis e agora queres que o amor regresse com cabeleiras fartas mas as coxas cavalgantes só agitam perucas.

30. As tuas nádegas invocam dosseis, cortinas, teatros demasiado artificiais, declamações de sofisticada eloquência.

31. Deus está tatuado. Na divindade tudo é evidência.

32. Eras pálida no teu auge de sangue. Os teus desejos floresciam entre jorrrantes angustias. Gostavas de pérolas. Tudo é pouco no máximo dos desejos.

33. E os terramotos ornavam a glória do deus ausente. Não era um deus ao qual faltassem nomes ou adequação. Era, pura e simplesmente um deus que condescendia com o Inadequado.

34. Transpiravas e abrias-me o mêdo com uma rapidez certeira. O mêdo é a porta mais òbvia para a musica. É a noite bivalve, escura como um poço.

35. A musica está cheia de espelhos para cima e para os lados. Desdobra-se em todos os sentidos. É penetrada pela erosão pictórica da caveira, pelo reflexo da vela que finge iluminar a natureza morta.

36. A pintura explica a musica como passagem das coisas para as coisas, como transferência de som entre contornos. Nenhuma coisa guarda sons porque há contiguidade entre todas as coisas. A exaltação das ilusões abre o som como desperdício de proporções.

37. A musica prende-se à variedade do seu eco. Persegue os harmonicos inaudíveis. Ela é escolhida pela amplidão (ou não) do espaço. Só o eco torna audível para lá dos inaudíveis.

38. Existiu um musico que disse: os sons são sombras e há muitas maneiras de mostrar as sombras. Há mil formas de cozinhar os sons. Mas ninguém se enobrece só porque sabe nomear alguns instrumentos. A instrumentação é a culinária que nos desembaraça dos espectros pitagóricos que fazem com justeza coincidir a musica com a glória asséptica dos números.

39. As sombras só existem na pintura como sugestão da sua negação. Existiram pintores que acreditaram que a pintura se defenia na sua literalidade. Mas a literalidade foi apenas o espectro da literatura menos literária. As sombras são as aspas literárias que falseiam as citações. Nada quer permanecer num plano uniforme e totalitário.

40. Somos literários quando nos abandonamos às ilusões, quando treslemos as frases, quando nos enganamos criativamente. As sombras semeiam o Erro.

41. Comparam os peixes a um momento musical só porque agitam a cauda vagarosamente. O odor dos peixes é repugnante. Recuso a prazer do marisco não porque seja uma ética mas é o meu corpo que se subtrai a esse regresso a uma préhistória aparentemente mais plena.

42. Sou civilizado. Não me revejo em nada puro, casto ou inacessível. Todo eu sou estradas e acessos, cruzamentos monstruosos. Preferiria que isto não fosse autobiográfico. Sei lá se é!

43. Mesmo aqui, ao tentar assassinar percursores, somos vítimas dos seus idiomas curtos. No entanto não me sinto enegrecer na teia desses demónios. Somo idiomas. Colecciono súores. Não temo a catástrofe da inexactidão. Quero bramir como um elefante em fúria. Quero morder as influências como nacos de carne junto aos ossos.

44. Querem-me hiena mas não passo de papa-formigas.

45. Não me quero sentar nas mesmas cadeiras alfabéticas. Os meus antepassados entram em mim cheios de copos de àgua. Bebem dentro e refrescam-me. É bom!



sábado, 11 de agosto de 2007

dá-me ò musa


Give me, o Muse, a tongue for tango,
A savage diction with the taste of mango,
A colonial mind with colorful wit
And philosophical mottos you can ride and quit,
Give me the darkness that enlightens the men
And the wise ignorance so hard to stand,
Give me the florid old fashion use
In witch all exceptions could be infused,
Give me a taste for moving details
Or looney allegories with frolic aims
And be the pregnant mother of things
Like an infant discovering new links.
Be an horse thundering in unrescued nights
Who runs, stops and changes the knights,
Be the dress that gives the nakedness
Of fresh ladies in illuminates pages,
Be the brothel of everlasting desires
And the laugh that redimes the criers,
Be, at last, someone who shares
The tilting enthusiasm without despair
An so, let us go on unending travels
Changing rimes and remaking marvels.

TEORIA E PRÁTICA DO MAL










A maldade é uma romã, uma fruta
aparentemente casta ou de boa casta ¾
enreda-se na teia solar, arde,
é ferrada pela força nocturna dos metais
nupcialmente.




Os tiranos ignoram-na,
dão-lhe desmamados filhos de bandeja.




Ensimesmados passam os dias
ou em almofadas, deixando-se cobrir de beijos e lamentos,
ou em indiscretos jogos de guerra
lançando escaldantes cartas e biscando trunfos sinistros.




Ao longe os jumentos são incomodados nas vísceras
por viperinas espadas,
e são várias as vozes degoladas.




As raparigas cantam aos infernais pardais
lamentos quentes e virginais
de quem torce os pés na praça
e na boca torce a mordaça ¾

o mal começa a inchá-las pela ternura,
é um diabo de múltiplas pernas
cujos cascos deixam pegadas eternas.




A traição avizinha-se sempre que imploramos o Belo
como animal de estimação
ou antiguidade de efeito surpreendente
arrancada ao labor e indústria de defuntos artesãos
e que agora jaz na vizinhança
qual incómoda cómoda jarreteira.




As musas, do sacro prostíbulo do poeta,
saltam galhofeiras das prateleiras
para em chacota ébrias palavras
insuflar ao poetastro janota
que aos olhos dos deuses não passa de anedota.




Por momentos esquecemos
através da imponderável e desvirtuada luz
que somos criaturas,
esterco animado por delírios,
maravilha fractal na colcha rota da eternidade,
e então mergulhamos nas anedotas abismais das metáforas,
bradindo com espelhos, bradando de joelhos,
sacudindo raspas de douradas maçãs,
passeando Cíclopes em circos anais,
desflorando cortesãs e hortelãs,
escovando os corpos com favos de mel
e expelindo em fábulas o horror e o fel.


Temos a ironia desse pulcro excesso,
dessa irrepetível agonia...
Mas protejam-nos os deuses da cruel beleza,
deusa leitosa, lenta e melada
cujas escamas cortantes são mimadas.




Dêem-nos antes o Belo em conta-gotas,
àcido, forte, doce, picante, cru ou bem passado,
mas livrem-nos da forma que tudo molda
que esquife nos confina a prisões grotescas e fatais,




Livrem-nos também do oculto e do repetido culto
abstracto,
polissaturado,
canastrão,
dos pés gregos e antigos
cujas sandálias esqueceram o suor e o chulé
e vibram na perfeição geométrica,
no vocábulo aprumado, de precisa métrica.




Porque o Ideal surge em zumbidos,
em airosas cornetadas,
em silhuetas inflamadas,
aperaltado de grilhetas
com sado-masoquistas tretas
e roupagens complicadas...




O Ideal projecta suas atraentes faces
onde o olhar persegue a beatitude
imersa em poalhas douradas
que, de facto, são angelical diarreia
vertida por arcanjos adolescentes em fase de revolta
contra Deus, o Mundo
e o Diabo que os carrega.




Mas a ideal plenitude do Ideal
é quando cansado de trepar paredes e tectos
que em trompe-l’oeil iludem o coroção mas o corpo não
cai na poltrona do entendimento
e com sabedoria de jumento
(que é bem mais sabedor
que as sabidas cavalgaduras)
se detém no acidental, na flor que é cada sinal,
na mortalidade
(alcachofra das nossas angústias),
no implacável finito
(que é o limite do grito),
no esperma que se desgasta improcriando ninguém,
na baba de caracol na meia de seda,
no presunto exposto ao tempo e às moscas.




Aí, a jactância contorna a maldade,
injecta o rumor,
vem contaminada de salutar conflito,
não desdenha a lei mas persegue a excepção,
combate a neutralidade na neutralidade
invadindo-a de carnívoros contrários
cujo oral ardor
não destrói pela indiferente indiferença
que no esquecimento do esquecimento mata
como o vegetarianismo hitleriano
para dissimular suores de carniceiro.




O Ideal alcança-se fagicamente
no banquete cruel de todos comerem todos,
na carne condimentando o espírito
que sopra sobre os abismos,
e tudo se enreda nas obstruções,
nas contradições,
que são a doce polpa do pensamento.




Porque as esporas do Mal são diáfanas,
passeiam-se na autocontemplação do espirito
e na prostituição anárquica da matéria:
é a solidão dos extremos em guerra,
é a fortuna da estupidez
com seus cornos e manhas
costurando traições sobre traições
mas traições insípidas de toupeira mouca
escavando buracos de fingimento perpétuo
como se os sentidos tivessem couraças.




Não se pode deixar de ver ¾
o cisne mergulha o bico
no lago em que Narciso não se busca
porque ao buscar-se mostraria o mundo
e os comentários etruscos da gente cusca:




Narciso é o cego na volúpia da cegueira
acomodado à grisalha dissolução das formas
e protestando contra a dissolução da perfeição.




Só no quebrado espelho pode Narciso
pela dispersão despertar
atormentado pelas ervas espezinhadas pelos caçadores furtivos,
pelo odor a borrego assado,
pelos insectos boiando mortos
na horizontal cortina de agua que desliza.




Não se pode deixar de ver¾
mas também não se pode ver totalmente
porque a violência e os estigmas do que se vê
cravam garras na retina,
arranham pela batalha dos aspectos,
cospem na pureza
e nas recordações com aura
que deixamos a pastar nas infâncias
com cordeirinhos de peluche.




Este relance que a pluralidade anónima do visto nos lança,
este relance fervilhante que nos quer arrancar olhares,
é o arroto da Luz:
os aspectos
a quererem ressaltar da Sombra plural,
o desenho a gangrenar,
a atravessar cerimonialmente os nossos orifícios
e a inchar-nos com um desejo de descuidada exactidão
contra as cuidadas inexactidões,
contra a candura que afoga heresias
e as faz abortar
com medo que tais filhas violem mães e pais ¾




quando as heresias são os acrescentos filiais,
a diferença de uma precisão,
a afinação de um pormenor
que revolve no todo e o reinventa com pimenta.




Assim, toda a Luz (natural ou artificial) é uma heresia,
novidade inclinada que desfigura a harmonia
redimindo os moribundos instantes.




Quanto ao Mal, romã remordida
por desdentados mendigos e apóstolos fingidos,
é sabor que não se pode exterminar,
é perigosa vizinhança de fantasmas
cujas proezas são a repetição e destruição,
é esfinge travestida de esfinge,
enigma de cabeceira com rabo de serpente
para parricidas inconscientes fornicarem maternalmente
desafiando as pestes e as gentes.




Só pela heresia permanente,
ilimitada responsabilidade
de quem crê contra a corrente
se pode o Mal esfarelar,
envenenando-o de Luz e Sombra
ou requintados contornos,
pois a indistinção é virulenta
e o Mal esquenta.

frenesim pulmonar (do sono)



PORQUE quando o sono estende os seus ramos bravos
e as suas antenas graves
o dia abre-se como uma lata de sardinhas
e o sol prolonga os seus dourados tentáculos
até às sombras serpenteantes que cochicham nas caves
e o incesto sente-lhe o calor como uma iguana
que olha com apetite uns insectos raros.




E ramificam as porosas contracurvas dos animais velozes
onde o medo se esbate na sedutora plasticidade das nozes
elidindo o excesso com músicas austeras
que não desdenham o contraponto que ilumina as esferas.




Mas esse tipo de música é fulminada na sua rota
por eclipses súbitos, silêncios vorazes
que traem o rumor sebento das ovações liláses.




E a agua entra na música como uma dúzia de doses,
em alarve pratada de apetitosas eiróses
para culminar em descontínuas cascatas melódicas
onde a escuta se desfaz em mera repercussão
num tamborilar auricular sem manete ou travão de mão.




E nesse sono, nesse indomável soco, nesse eco com reboco,
os peixes penetram nas ânforas disfarçados de vítimas
para a perplexidade de um ritual dito sacrificial
e oferecem-se como um manequim numa vitrine,
como mourisco alaúde com qualquer coisa de genital,
deixando que as cordas esticadas
em couraça de devorado lavagante
sejam rasgadas pelas unhas pintadas dos irrequietos sacrificantes.




Então as enguias enguiçam nas encardidas mães,
vertem a sua crueldade em choques eléctricos,
em movimentos dessincronizados de guindaste
e amadurecem os apetites carnívoros dos eternos filhos
que obscurecem os colunáveis planetas
com a sombra prateada da sua eloquência
tocando flauta chinesa junto a junquilhos.




Este amor impróprio relaxa na mesa de cabeceira
que se deseja apolínea na autocontemplação perversa.




Os dedos perseguem-na como prescrita farmacopeia,
chamuscando-a pela ambiguidade pelada do movimento.




E os anjos deixam-se emparedar no sangue,
nas masturbações intermédias da sabedoria,
no dialecto aparatoso da desmesura.




E então compreende-se como toda a harmonia é intra-uterina,
como as cadências conduzem o Ser para um desfecho chato
onde tudo se empilha com a raiva do cimento
ou se solda com o salário baixo do mulato.




E há ecos nesse amor bifocal:
um cometa que se plebiscita com cio,
a irrisão que se revela nas cavalariças,
a revolta que dá razão à preguiça.




Onde poderá existir castidade que não colida
com a anatomia caudalosa da lagartixa?




Onde pode a beleza simular o seu ímpio suicídio?




Onde é que a angústia pode tornar-se letra morta?

Onde é que a ironia se desembaraça da gota?




Onde é que um dinossáurio pode incendiar a retorta
para que a lua sobreviva no seu radiografado interior?





Apesar disso as laranjas, com a habitual habilidade,
anunciam a sua popular imobilidade
perante os gemidos telefónicos dos deuses
e os melancólicos suspiros nos góticos engarrafamentos
de condutores agoirentos.




A agua anima essas ficções como fabricante de lama
onde os serpentinos adoradores se revolvem com ou sem grama
mostrando que só há redenção num saber que se difama.





Porque os símios beligerantes dedilham as cordas tensas
da eternidade sempre infusa
que se vegetarianiza imediatamente
entre a pasta de dentes e a massa confusa.




Os casulos dos parasitas violetas
largam larvas que os perfuram
com a acutilância exacerbada dos atletas
e concisão sintonizada das antenas.





E os ciclos são constituídos como um ninho ou uma colmeia,
como impenetrabilidade de qualquer residência por gente alheia.




Os ciclos são parágrafos imensos sem saída possível
são indecidíveis arquitecturas de geométricos ecos,
são o deleitoso sem compaixão pelo horrível.




Porque as pedras enverdecem por necessidade sísmica,
para que os leões de cobre incendeiem os sonos maternos
com os rugidos multiformes dos ascetas modernos.




E a sua juba é o júbilo quase sempre retardado
dos pais que apascentam a sua potêncial filiação
com ninfas e semi-deusas, deixando que um devir errado
dê lugar a um ainda mais complicado acaso.





Chega um filho e diz: sou uma batata quente
ou um ovo escalfado numa frigideira fervente.




Como ninguém se admira, ou não se convence
recorre-se aos tradutores que imaginam no rasto bilingue
que o medo lhes é papel de parede ou adorno cretense.




O filho é apenas um copo de agua gelada através do qual os pais
passam a sua descrença aos anónimos adversários.




A posteridade é eterna na sua espinha dorsal,
nas pancadas rituais da libação mercurial.




Mas a posteridade é o consomé sempre consumido com gosto
no desaparecimento iniciático do medo no rosto.




A posteridade sobra aos golpes ousados dos estilistas
que querem confiná-la à aparição súbita nas revistas.



As batatas são filhos escalfados com salsa
no odor quente da cinza de uma tasca num guetto.




As borboletas pousam no adiado problema
como imperceptível toque de mestre zen.




E as árvores enroscam-se na dialética edénica da serpente,
porque as árvores digitalizam os dias na sua fotossíntese discreta,
e sabem que cada dia é o espreguiçar uraniano
cortado, já há muito, o cordão umbilical terrestre.




Antes os venenos actuavam sem nenhuma dificuldade,
mas hoje a noite entornou a sua prodigalidade
e temos que a procurar nos espelhos reflexos
que nos firam como óbuses ou morteiros obsoletos.




Recorremos à redundância para acertar as agulhas,
para regressarmos aos auspícios de nenhum começo
onde as mães se descobrem filhos na fiação das parcas
e os pais encomendas à procura de endereço.




Então os pais selam os cavalos e agarram num punhado de terra,
sentem-se épicos, mas não vão para a guerra.




Despedem-se das colinas para entrarem gramaticalmente
na carne dos filhos como galgos lentos.





E duplicam-se como um livro escorreito,
transmitindo a virgindade a que não têm direito.





Porque fizeram lentos os homens ultrajados
a quem o destino pôs cornos como açúcar no leite
para que outras mulheres os pudessem beber
com inefável compaixão ou interesseiro proveito.




E deram-lhes pão em vez das chagas do corpo
como quem os atira para a ressurreição
ou para um cano de esgoto.




E douraram-nos como os douradores pacientes
ajustam a folha de ouro às molduras reticentes.




Essas mulheres são como cactos mexicanos
na sua imobilidade espinhosa de matriarcas.




São como abacates maduros com limão e coentros
num guacamole sem tomate nem pimentos.




São como deusas ensonadas
comendo carne sem dentes.




Mas a lua cede à gesticulação dos gagos,
cede ao sono e aos pirilampos
que levam as estrelas até às mãos dos miúdos
e espalham o céu por esses campos.




Essas mulheres encostam-se nas chaises longues
em varandas dianteiras com o ciúme no horizonte.




Um ciúme de iluminura tercentista, é certo
e não um ressentimento fácil de Aqueronte.




E tecem grinaldas em volta desse ciúme
enquanto ouvem passos no andar de cima
da avó que traz ao colo o neto
e acalenta outra ideia peregrina.




Criam terramotos incestuosos para lavarem os pensamentos.




Será para dissimularem os dragões
que se instalaram nas cavernas do sexo
e que um S. Jorge matará decerto?




Aquecem-se nas lareiras do pessimismo
e atiçam o fogo com descontentamento.




Depois as cerejeiras florescem
sem que habéis podas intervenham no processo.




Os homens esfregam com instintos canalhas
os pénis cornudos no exterior das muralhas
e as crianças barram a esburacada fatia de pão
ensopando-o com carradas de sol e cacau.





Porque puseram corpos onde as palavras
eram mera táctica fonética,
errância de uma demanda céptica
em que o Graal é cláusula informal.



Mas os corpos desejavam esse sabor a sério
sem mistura de pátria ou desculpa de império.




E colocaram icebergues infinitos
quando avançaram contra os titânicos mitos.




Ficámo-nos por uma vergonhosa hesitação
cheia de alusões às evidências críticas do sonho,
com metáforas a transfigurarem-se em miragens
e estas últimas a porem em causa o que há de medonho.




Como por exemplo: as irmãs e os seus soberbos ciúmes,
a sua rápida entrega sexual entre encadernados volumes
como um néctar mortal.




Ou o beijo na trovoada que a mãe vislumbrou ao longe
com os seus binóculos de ópera
que tornaram tudo ainda mais irrevogável.




Assim os corpos eram como a massa de padeiro
à qual se juntava mel no tabuleiro.




E cresciam num forno morno
com a falácia do fermento
e a inevitável dor de corno.




Os cavalos não se contentavam com a rivalidade deste fôlego
e os touros eram empurrados para a sua insignificância
negra e repetitiva, vazia e estúpida como o inconsciente.




Eram corpos que já nasciam com lingerie
e que desejavam ser talhados como melâncias em agosto
ou devorados em triângulos da “vache qui rit”.




Os meteoros colidiam perto de uma aparatosa cáfila,
o melro debicava uma carcaça de escaravelho morto
e na gaiola o papagaio imitava a agonia de uma cotovia:
são estas as imagens que me deixam absorto!




As estrelas continuavam luzindo na sua astrológica falcoaria
contrastando com os escombros gramaticais
e a agonia imprevisível de Golias.




As centopeias saíam debaixo da roupa caída
atraídos pelo odor vertebrado do sexo e seus canais.




E do granito brotava leite azedo de burra velha
e esse azedume entrava nas vidas através de quebradas telhas.




E os nossos traiçoeiros amigos rastejavam
entre sonhos de berbéres marroquinos
como submissa mercadoria sem precioso destino.




E cada sílaba era como uma “chicotada psicológica”
num clube que ambicionava apenas
a manutenção
na mesmíssima divisão.




Então o filósofo voltou a banhar-se nas mesmas outras aguas
como se as fontes repetissem seus gestos canibais.




Porque cavaram um fosso pejado de leões
entre o profeta itinerante e as galáxias em expansão.




Julgaram que a infância redimia do presente o sublime
e que o passado se inclinava como humilhado súbdito
perante os mandarins da maturidade
com os seus caprichos de alta velocidade.




Mas a memória é como as rabanadas de vento
fechando janelas e portas violentamente.




E o pensamento é a crina que amacia a insubmissa pele ¾
flutua entre taças a transbordar de cacau espesso
contenta-se com as caseiras compotas de goiaba
e deixa-se atrair por anéis de monarcas perversos
e pela atraente ideologia errada.



Mas os puros círculos são pobres
na sua imaginação florida
e nos maleáveis suplícios.




¾ São pobres como o porco que revolve a eterna lama do tempo
fustigado pelo negro granizo de apocalipses violentos.




¾ São pobres como qualquer obsessão
com o seu núcleo de passos irrequietos,
as suas valsas periféricas, os seus carrosséis em decomposição,
os seus apinhados autoestradas
e seus alicatados becos.




As crianças procuram os círculos nos rebordos da louça
para sossegar a natural desmesura da história,
ou para se excitarem na vertigem épica da glória
e na rapidez inclinada da montanha russa.




Atam-se ao céu através da ofegação de um velho gato
e os astros rebaixam-se a elas como para devorar um prato
e revolvem-lhe a saliva com a colher impiedosa
de uma cozinheira tribal grande e poderosa.




Então a arquitectura ampara-os no parapeito das escadas
porque ainda têm um tempo sem sofoco, porque o roseiral
mantém as suas flores com as pétalas muito fechadas
como uma persiana sobre a estupidez que assoma aos poucos.




Mas a maldade segura-as, e as dobradiças murmuram planos
que executarão passados muitos e muitos anos
enquanto as famílias dormem deitadas acima dos rodapés
e as cegonhas compõe os ninhos nas chaminés.




Murmuram o presente como se este fosse insónia,
ou a cabeça de um leão empalhada numa sala escura
ou ainda uma paisagem inóspita da Patagónia.




Murmuram os solestícios que se enroscam como serpentes
e as ossadas dos mamutes a descobrir subitamente.



Então, as fêmeas grávidas seguram a opaca criatura
pela qual se deixaram parasitar
e que um duende apadrinhou
até que o nascimento, como um espelho partido,
a catapulte para o frenesim pulmunar,
feito de ofegações crónicas entrecortadas de gemidos.





Porque consideram os mapas com alergia
que se prolonga na guerra que a mão esfria.




Mas a areia pisada é agora desprezada
pela sola suja dos sapatos e (particularmente) do tacão.




O vulnerável pé (que não chato)
foi substituído pela borracha texturada,
encerrada a pele e os pêlos em túmulos de tecido
ou em peles de animais desprotegidos.




Assim, quando os licornes chineses
improváveis passeiam em jardins ocidentais,
os nossos pés não sentem o calor deixado plas suas patas
nem a morte de Confúcio nos umbrais.




Então acordamos para um vácuo estreito
com variadíssimos nós na garganta
que se desatam quando um vigoroso galo
por coincidência se empoleira e canta
inchando a crista e empolando o peito.




Por fim algo nos atinge os ossos com calor
fazendo surgir desarmado o hábil caçador.




Quando a Unidade se retira das esteiras
em que em ódio de estimação repousava
o diamante ramifica nos traseiras
de um inédito bairro da lata
como flecha maternal e curandeira.




E os símbolos levantam as tendas
passada a tempestade de areia
e os assaltantes que surgiram como que do nada.




Porque quando o sono cresce no dia
com as suas serpentes entrelaçadas
o dia revela-se ainda mais diurno
do que o desaparecimento óbvio dos mapas.
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